Cunha e Silva Filho

        As informações que me passam os jornais ou outros meios de comunicação é que, em quarenta anos, nunca se conheceu, máxime em São Paulo, um período de falta de água nos rios que servem à população paulista e especificamente à metrópole de São Paulo. Os reservatórios de que dispõe esta cidade estão em níveis de ameaça à população, mas ameaça mesmo, com possíveis consequências de alto impacto para seu povo, seu comércio, sua indústria, enfim, a sustentabilidade desse grande e vital estado brasileiro.
        De resto, a capital paulista está enfrentando de início estiagem e contraditoriamente inundações, quer dizer, sofre com os estragos das grandes inundações, dos raios, das tempestades e diminuição severa de suas fontes de água potável, como se já não bastasse uma série de outros graves problemas enfrentados por São Paulo, sendo o maior deles a violência desmedida no cotidiano da capital.
        A reação dos paulistanos e paulistas tem se mostrado de várias formas: lamenta pela escassez de períodos de chuva mais prolongados e reclama, com justiça e direito, dos responsáveis pela administração estadual e municipal. E com razão.
       Não somente é culpado o atual governo de São Paulo, de vez que o fenômeno de escassez de água potável deveria há muito ser tratado com a maior responsabilidade possível. O setor que cuida do abastecimento de água é um dos pontos deploráveis na questão que se discute neste artigo. Com o crescimento descomunal da capital sobretudo demográfico, exigindo uma demanda gigantesca de suprimento de água para uso humano, as autoridades que governaram São Paulo pouco ou nada fizeram e nada previdentes se mostraram quanto ao futuro da capital e do estado em geral.
      A isso chamaria de governar improvisadamente em alguns setores vitais como o do abastecimento de água de qualidade para a população. Obras de engenharia que se fizeram - construção de reservatórios - não demonstraram nenhuma visão prospectiva do que poderia ocorrer no estado de São Paulo. E, em proporção menor, a mesma crítica se estende aos estados do Rio de Janeiro, cuja capital é outra metrópole super-demográfica, com Minas Gerais, idem.
     Com o conhecido defeito da improvisação em lidar com a coisa públicas, nenhum dos governantes ( e esta crítica se dirige a quase todos os governos estaduais do país ao longo da nossa história), teve, repito, uma visão mais arejada do que, com o vertiginoso crescimento da população, sobretudo de imigrantes, poderia acontecer com o nosso potencial hídrico. Por falar em improvisação, leio, em tradução minha, um capítulo didático em inglês, de Eugênio Malanga (1), em que, louvando o progresso e a grandeza da cidade de São Paulo, faz um assertiva desta ordem, que vale, para os dias sombrios atuais da metrópole, como se fora um vaticínio: “A fundação de São Paulo nada tem de espetacular. Não foi planejada, não se desenvolveu,  não foi planejada para ser uma gran de cidade. Aconteceu por acaso.” Por outro lado, em outro trecho, aquele autor recorda que, pelo progresso e crescimento vertiginosos de São Paulo, ela já se comparou a Chicago, a Detroit e lhe chamaram até de “a Manchester brasileira.”
     Por conseguinte, não devemos culpar a Natureza só pelo que está vivendo São Paulo; com ameaças     climáticas e pluviométricas da mesma ordem estão dando sinais  o Rio de Janeiro e Belo |Horizonte, outra capital de grande concentração demográfica.
    O que não pode permanecer é esse estado de insegurança sobre como viverão essas capitais com crescente escassez de água para uso humano.
    Os governadores dos três estados já estão até falando em racionamento “pesado” de água para a população, numa proporção de causar horror: cinco dias sem água para dois dias com água nas torneiras.
     Não me venham tais governadores tentar tampar o sol com uma peneira com afirmações que são meias-verdades a fim de esconder a completa ausência de tirocínio e de espírito de previsão que são condições básicas a quem governa um estado da federação..
     Os prejuízos da população já são enormes com a falta de água. Como, pois, ficarão funcionando os hospitais, as escolas, as universidades, o corpo de bombeiros, os restaurantes, os asilos, os apartamentos, para não mencionar tantos e tantos outros setores que, sem água, não poderão resistir por muito tempo?
     A Presidente Dilma afirmou que pela Constituição cabe aos estados a resolução desses problemas relativos à falta de água. Ela está redondamente enganada. Somos uma República Federativa com estados que funcionam conjuntamente com o apoio do Executivo Federal. A situação que se nos apresenta é de emergência, de exceção, de necessidade do suporte do governo federal, até mesmo e sobretudo na destinação urgente de recursos financeiros para solucionar em curto prazo o sufoco por que está passando São Paulo.
     A Presidente da República não pode absolutamente se omitir na discussão urgentíssima a fim de formular um plano emergencial para estudar e equacionar, com o auxílio inestimável de nossos engenheiros e cientistas, sem descartar nossos especialistas no assunto das melhores universidades brasileiras, uma saída técnica para prover São Paulo e os outros dois estados de formas de canalização, por exemplo, através de ductos, como fez a Rússia em relação ao gás transportado para outros países da Europa. Transposição de rios brasileiros não é a única correta solução e o que se tem visto neste sentido tem tido efeito contrário e prejudicial ao fluxo navegável dos rios. Haja vista essa obra que se está tentando realizar (dizem até que a obra está paralisada!), i,e,, a transposição do Rio São Francisco, que tem dado sinais de se tornar um rio temporário com algumas fontes de água já secas.
     É inconcebível que o país que tem o maior rio do mundo em volume de água esteja passando por este flagelo da seca, assemelhando-se, em alguns aspectos, ao “Polígono das Secas” do Nordeste. Será que teremos, então, no futuro, ficcionistas reproduzindo cenas de Vidas secas, obra-prima de Graciliano Ramos (1892-1953) com novos Fabianos, Sinhas Vitórias e cachorras Baleias tendo a cidade de São Paulo como o espaço da tragédia brasileira? Seria cômico se não fosse trágico.
   As populações dos três estado do Sudeste devem se unir e exigir urgentíssima posição dos seus governantes e da própria Presidente Dilma satisfação para esta situação tão aflitiva aos estados afetados, principalmente São Paulo. Se alegarem que não têm condições financeiras de bancar uma obra de grande vulto para resolver este premente   e mesmo dramático problema por que atravessam os paulistanos e paulistas, seria o caso de se indagar: e o dinheiro que o escândalo da Petrobrás desviou do Erário Público, ou seja, do povo brasileiro?
   E as outras falcatruas ( os escândalos do “Mensalão”) cometidas durante a gestão Lula e, sob  outras formas, na  de Dilma? E a gastança com os vencimentos de marajás de senadores e deputados federais, de ministros do Estado, do número desmedido de ministérios, do escândalo da Petrobrás, reaformo,    dos cartões corporativos, do dinheiro público canalizado para as campanhas políticas, entre tantos outros “malfeitos” (jargão da própria Presidente) do governo federal? Ora, não me venham declarar que não dispõem de dinheiro para realizar obras de alta envergadura a fim de amenizar o sofrimento dos paulistanos e , quem sabe, dos cariocas e mineiros?
   Se existe estiagem, reconheço, mas não me venham convencer que a culpa do descalabro em São Paulo é só da Natureza. O dedo humano tem um efeito muito mais pernicioso porque pode levar a cidade ao caos e à desordem na luta individual e ignorante: “-- um gole d’água, por amor de Deus!

(1) MALANGA, Eugênio. Vamos aprender inglês. v. II. São Paulo: Editora “Ave Maria” Ltda.,1959, p. p.83-84.