QUASE AUTOBIOGRAFIA
Por Washington Ramos Em: 04/06/2025, às 11H56
[WASHINGTON RAMOS]
Malhadinha foi o primeiro livro de José Expedito Rego que comentei aqui. O segundo foi Horas sem tempo. Vidas em contraste, o terceiro. O quarto, Os caminhos da loucura. Os quatro são comentados positivamente. Quando a obra literária é ruim, prefiro me calar.
José Expedito Rego não é o único autor do passado que estou resgatando do esquecimento. Joaquim Castro Aguiar e José Ribamar Oliveira já tiveram romances seus comentados aqui também. Meu propósito continua firme. Ou seja, quero tirar da indiferença e do esquecimento escritores piauienses que não estão mais vivos e que, logicamente, não podem mais divulgar a própria obra. Suas famílias não estão nem aí. A maioria dos descendentes sequer leu o autor quando este estava vivo. Imaginem agora.
Quanto aos autores vivos hoje, eles têm toda a condição de divulgar seus livros. Além disso, a maioria só quer saber de elogios e endeusamento, mas eu não escrevo para enaltecer ninguém. Sou radicalmente contra o culto à personalidade.
Mas voltemos a Os caminhos da loucura. Trata-se de um livro que, em sua ficha catalográfica, é classificado como romance. Não deixa de o ser, já que tem ingredientes romanescos. Porém, numa leitura mais atenta, percebe-se que é uma quase autobiografia de José Expedito Rego. O personagem central (Juca) tem várias semelhanças com o autor: ambos são médicos, se graduaram na capital da Bahia e são mulherengos educados, contidos. Tanto em Oeiras como em Salvador, estão sempre se envolvendo com mulheres. Numa das vezes, com consequências graves. Outro indício de que o livro é uma autobiografia disfarçada de romance é o próprio título. Caminhos da loucura não é um título muito adequado para uma narrativa de ficção. É muito explícito. Ajusta-se melhor a uma obra da área médico-psiquiátrica.
Há ainda um fato da vida do autor presente no livro que é exatamente sua candidatura a prefeito de Oeiras, apoiada por um padre. Este era Baldoíno Barbosa de Deus, grande amigo de José Expedito do Rego na vida real. No romance, esse sacerdote é o padre Balbino. Após a campanha eleitoral e a derrota de Juca, desencadeiam-se crises de loucura nesse personagem, provocadas pela série de safadezas ocorridas durante a campanha eleitoral. Todo mundo sabe do cortejo de misérias que ocorrem numa disputa pelo poder político. Compra de votos, chantagens, alegações de favores, falsificação de urnas, voto de gente morta... Tudo isso continua acontecendo na política brasileira, com exceção da falsificação de urnas, seja nas pequenas cidades ou nas grandes metrópoles. Pois é! Esse conjunto de maldades levou Juca à quase loucura total. É assim que termina a narrativa.
Há ainda dois fatores que confirmam o caráter autobiográfico do livro. O primeiro são alguns textos de Crônicas esquecidas, obra da autoria de José Expedito Rego, os quais não são ficcionais e neles esse escritor coloca informações verdadeiras que estão também em Caminhos da loucura. O outro fator são conversas que tenho tido com meu caro amigo Carlos Rubens, que é de Oeiras e conviveu pessoalmente com o autor de Malhadinha. São papos esclarecedores sobre situações da vida de José Expedito Rego e as quais estão presentes na vida de Juca, o personagem central de Os caminhos da loucura.
Ninguém pense que esse aproveitamento da vida real no livro do escritor oeirense seja algo pequeno. Não, não é. Todos os escritores fazem isso, pois ninguém tira nada do nada. De Homero, na Grécia Antiga, a Álvaro Pacheco com seus poemas sobre o rio Parnaíba no livro Margem Rio Mundo, todos estão copiando esteticamente a realidade.
Agora o que se faz necessário é uma nova edição de Os caminhos da loucura, livro que nos leva a um conhecimento maior de um dos melhores escritores piauienses.