Quando acabar o maluco sou eu
Por Bráulio Tavares Em: 11/08/2011, às 21H10
[Bráulio Tavares]
Sou maluco? Tudo bem, então sou maluco. Maluco porque quando tinha 12 anos improvisei uma bicicleta com duas rodas traseiras porque eu caía muito e na vizinhança mangavam de mim. Concluí que precisava de mais estabilidade, correto? Não ficou cem por cento, eu não tinha ideia de como é difícil cortar e soldar metal, usei material de segunda mão, continuei caindo e mangaram mais ainda. Dizem que sou maluco.
Na verdade já diziam antes, inclusive os professores. A professora de Português me botou de castigo porque eu disse que só quem liga para a diferença entre preposição e conjunção é professor de Português. Me perguntou o que eu queria ser na vida. Eu disse: “Tudo, menos professor de Português”. Não que o professor de Matemática escapasse. Passei um fim de semana debruçado na mesa, aos 14 anos, com uma descoberta que fiz. Vocês já repararam que a diferença entre os quadrados dos números naturais sucessivos são os números ímpares sucessivos? Vejam os quadrados: 1, 4, 9, 16, 25, 36, 49... Confere? Veja as diferenças entre eles: 3, 5, 7, 9, 11, 13... Confere? Mostrei àquela anta de óculos, ele leu minhas folhas de anotações e rasgou, dizendo: “Zero. Você é maluco. Eu não mandei fazer isto, mandei praticar raiz quadrada”.
Não vou fazer uma lista completa, não sou maluco. Namoradas? Eu perdoo porque sou um cara romântico e de bom gosto, só me apaixono por mulher linda. Perdoei Norminha quando ela me deixou dizendo que estava cansada de tentar técnicas telepáticas, estava começando a pensar coisas que não eram da cabeça dela, e nunca mais falou comigo. (Não precisa. Há onze anos leio o pensamento dela e me divirto de montão.) Perdoei Selma quando me trocou por Vélber da Recebedoria, porque eu desenhei pra ela um vestido (nem existia velcro naquele tempo!) que bastava um puxão na direção certa pra sair todinho de uma vez. Disse que eu era maluco e que se tinha jeito pra figurinista é porque eu devia ser gay. Perdoei Dulce que não queria dormir na cama que eu construí (dizia: “isso nunca foi cama nem aqui nem na China”), Laura porque tudo bem, aquele remédio que matou o bassê dela era uma dosagem experimental (reduzi desde então). E a todas eu dizia: “Sou maluco é por você, vem cá, deixa de ser linda”.
E assim caminha a humanidade. Agora estou com 37 anos e continuam me chamando de maluco. Porque pendurei o celular (que eu vivia esquecendo) num cordão ao pescoço. Porque tatuei no lado de dentro do braço que sou alérgico a AAS. Porque descobri um jeito de pintar a óleo e manipular as cores no microondas. Porque peguei um software combinatório, entrei no banco de dados e criei um sistema de justapor temas e estilos para criar histórias. Porque estou escrevendo quatro autobiografias diferentes e verdadeiras, uma página por dia. Ora que diabo, a vida tem mais soluções do que problemas, a prova disso é que vocês vivem se queixando e eu sou o único homem verdadeiramente feliz.