Poemas Piauienses
Por Marcos Freitas Em: 08/10/2022, às 11H49
vacaria
da vacaria do Angelim - estrada de Palmeirais -
vinha o branco leite todo dia santo
o galo e seu canto clareando a manhã
de gente e vasilhames em fila: nós meninos
* * * *
cada dia um de nós a cumprir seu dever
aqueles eram tempos, tempos de haver
(pai, mãe, algazarras, meninos, brinquedos)
o creme de leite fresco gerando manteiga
de se pôr em garrafas
lagoas marginais do rio Poty
os aguapés e os sapos não moram mais nas lagoas
os aguapés e os sapos não moram mais nas lagoas
essas quedam soterradas exatamente onde ergueram-se
luxuosos shopping centers e ventilados apartamentos
com varandas amplas, de onde pode-se contemplar
o majestoso pôr do sol, o resplandecente tapete verde de aguapés
sempre bem alimentado pelos esgotos não tratados
os aguapés e os sapos não moram mais nas lagoas
os aguapés e os sapos não moram mais nas lagoas
redemoinhos
o rio Parnaíba tragou o vizinho da rua 24 de janeiro. minha mãe nos falou: “o rio é perigoso, não tem cabelo. cuidado, muito cuidado”.
nós, meninos, não tivemos coragem de ir ver o corpo inchado, achado pelos bombeiros dias depois do desaparecimento.
naquele dia, dormimos com medo do rio. melhor, passamos a noite em claro. apavorados.
campeonato intercolegial de volleyball
sim
você pega a kombi
com o restante do time
chega naquela quadra quente
às duas da tarde
(para quê aquecimento?)
de um colégio público no bairro Sacy II
bate bola em dupla
faz uns saques
treina uns cortes junto à rede
agora é hora de começar o jogo pra valer
ficam os seis escalados
para iniciar a partida
o árbitro da federação piauiense de desportos apita
autoriza o saque adversário
você olha para o lado da quadra
e vê o Padre Ângelo esfregar as mãos
e falar: “vamos, vamos!”
Publicado na Revista da Academia de Letras do Brasil, Ano 2, Número 4, jul./dez., 2020, ISSN 2674-8495.