Para ler no balançar da rede
Por Chagas Botelho Em: 25/11/2023, às 21H24
[Chagas Botelho]
As crônicas da professora e escritora Dapaz Sousa são um convite para um momento de deleite. Daqueles de se armar uma rede na varanda, numa bela manhã de domingo, aconchegar-se bem no fundo dela e começar a desfrutar dos vários eventos narrados.
Sua abordagem traz ora paisagens rurais, ora urbanas. Mais que isso, há também narrativas que permitem um riso aqui e outro acolá. Todas escritas sob medida e com um grau elevado de exímia observadora do cotidiano.
Em “Amanhecer na Vila”, por exemplo, inclusive é o texto de abertura do livro, a autora lança seu olhar perscrutador sobre o despertar de uma pacata localidade interiorana. Ao presenciar os primeiros movimentos, logo é preenchida por uma sensação indescritível de calmaria que provoca prazer e preguiça. Isso um pouco antes de arrematar em consonância com o telurismo e a gratidão: “como é bom o renascer de cada dia na cidade do interior”. Portanto, aqui, é o ponto de partida de suas idiossincrasias regionais.
Ao avançar, sempre com um pé na parede impulsionando o balançar da rede, ler-se Dapaz Sousa cantar com desenvoltura a imensa paisagem que lhe circunda. E que de imediato ganha prestígio em sua prosa. Poderia até acrescentar que é a sua verdadeira matéria prima ou o seu mais precioso capital: “estava na tranqüilidade do meu refúgio de final de semana. Um sítio onde criamos nossos bichinhos e procuramos desacelerar um pouco a correria do dia a dia”. O trecho citado está contido em “As vacas” que induz, de certo modo, imbricamento entre o bucólico e o humor.
Por falar em cômico, é impossível não perceber a presença deste recurso em alguns textos, digo, em algumas situações inusitadas, tais como: ”Conversa de pescador”, “Sou seu marido”, “De médico e louco” e outras que levam o leitor, que ainda está lá no vai e vem do balançar da rede, corroborar com o filósofo Terry Eagleton, quando este diz: “O humor faz pelos adultos o que a brincadeira faz pelas crianças”. De fato, senhores, ao entrar em contato com as narrativas de Dapaz Sousa, por vezes, nos sentimos peraltas risonhos.
O livro desta educadora da cidade de Regeneração, localizada ao sul do Piauí, nos leva ao encantamento de uma prosa madura e cheia de louvação ao seu quintal, à sua gente, à cordialidade provinciana, às tradições e às memórias indeléveis. Deve ser a herança da poesia, já que é uma poetisa nata. Tudo está misturado nas graciosas páginas que merecem a devida atenção daqueles que amam o seu cantinho especial no mundo. Não resta dúvida, este material irá engrandecer ainda mais o acervo literário piauiense. Agora, só resta saber se a rede realmente foi armada, se sim, então, vamos lá, tibungue e boa leitura.