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O NOME DO PAI – ROGEL SAMUEL

 

Na última vez que estive em Manaus resolvi passar por aquela Praça inclinada conhecida como dos Remédios.

A praça estava quase deserta sob o forte sol da tarde e só havia ali um menino com um gorro sentado num banco, imóvel, olhando fixo o grande rio que desfilava o seu negro mistério lá embaixo: o Rio Negro.

Mas ao passar eu o examinei de relance e vi que ele estava como que hipnotizado na sua contemplação sobre as águas.

Desci ainda uns dez passos e me voltei, pois minha curiosidade e estranheza me dominava para indagar e conhecer aquele estranho jovem. Teria talvez uns 16 anos.

- Dá licença, disse-lhe eu, sentando-me a seu lado, um tipo indígena, baixo, forte, cabelos muitos lisos, olhos amendoados fixos no horizonte.

Ele nada respondeu, fez apenas com enfado um gesto com a boca que parecia dizer “tanto faz você sentar aí, ou em outro lugar”.

- Como você se chama, insisti.

- Oceano, ele respondeu.

- Como? Indaguei, espantado.

- Oceano, disse-me ele outra vez, ou foi o que eu ouvi daquele seu sotaque espanhol.

- De onde você é, continuei, e ele me contou que era boliviano, que atravessou a fronteira para fazer compras para a mãe, a família pai, mãe e irmãs, mas não conseguiu regressar para a casa, fecharam a estrada e ele acabou sendo jogado em Manaus sem ter para onde ir.

Fiquei emocionado, esperando, mas nada mais falou.

Naquele momento passa uma bicicleta vendendo quentinhas de almoço, paguei e esperei para vê-lo comer com fúria, beber com sede o copo de refresco que vinha junto e me levantei para partir.

Foi só quando já tinha dado dez passos que escutei a sua voz:

- “Espera, como te llamas ? Cuándo lo volveré a ver?” – e senti uma aflição em suas palavras.

Pensei em lhe dizer a verdade, que voltava para o Rio de Janeiro naquela mesma noite, que nunca mais o veria, mas me lembrei de que ele estava só, sem pai, nem mãe e irmãs, e por isso menti:

- Em breve, disse-lhe eu, e atravessei a rua, sem lhe dar meu nome.