[Bráulio Tavares]


Jonathan Carroll é um romancista nascido nos EUA e que mora em Viena há mais de 30 anos. Faz mais sucesso na Europa do que em seu país, e é um autor de romances fantásticos pouco convencionais, que não seguem um modelo previsível, e nos quais tudo (quase tudo) pode acontecer. Mesmo autores delirantes como Philip K. Dick ou Lucius Shepard têm uma certa lógica em seus processos, que depois de assimilada se torna previsível. Carroll não, ou talvez tenha, mas nos quatro romances que li ainda não deu para me prevenir por completo. É um dos poucos escritores de quem eu aceito fazer um animal falar.

Diz ele que não sabe até agora quem é o seu público: “Por exemplo: na Polônia, onde vendo uma porção de livros, todos os meus leitores são mulheres entre 20 e 30 anos; na França, são aqueles acadêmicos esnobes; na Alemanha, são punks”. Estou lendo um conjunto de seus romances chamado “O Sexteto das Preces Atendidas”, seis livros que contam histórias meio surrealistas ocorridas com um grupo de pessoas que se conhecem entre si. Cada livro aborda a vida de uma delas e as demais aparecem como figurantes, ou são citadas de passagem. Bones of the Moon (1987) conta a história de um dona de casa, Cullen James, que tem sonhos que transcorrem noutro universo; Sleeping in Flame (1988) é a história de Walker Easterling, um ator que sonha com vidas passadas e tem um mistério na infância; A Child Across the Sky (1989) fala de dois cineastas amigos, Weber Gregston (intelectual e cult) e Philip Strayhorn (diretor de uma série de filmes B de terror); Outside the Dog Museum (1991) conta como o arquiteto Harry Radcliffe recebe a incumbência de construir um museu de cachorros no Oriente Médio. Ainda não li After Silence (1992) e From the Teeth of Angels (1993).

Esses livros têm como protagonistas artistas de classe média, alta, ou simplesmente ricos, no eixo EUA/Europa (Viena aparece em quase todos), cujas vidas são tomadas de assalto por fatos inexplicáveis e grotescos, que os forçam a difíceis decisões éticas. São freqüentes as alucinações, abortos, morte violenta de personagens simpáticos, crianças em perigo, crianças bizarras, coincidências estranhas, animais que falam, reconstituição moderna de mitos do passado... Carroll tem sido comparado aos autores do realismo mágico latino-americano ou ao pintor Magritte, o que é correto, mas não esgota suas surpresas. É um desses casos raros de um autor fantástico que cria suas próprias regras e suas próprias exceções – o que acaba incomodando de início o leitor, acostumado a ver livros que são façanhas acrobáticas diferentes com os mesmos malabares de sempre.