Fotos Antigas
Por Elmar Carvalho Em: 23/11/2017, às 05H34
Fotos Antigas
Elmar Carvalho
Onde estão aquelas pessoas
que assistiam ao comício na velha praça,
que já não existe, exceto na foto desbotada
e carcomida pelas traças implacáveis?
Muitas já estão dormindo,
dormindo profundamente
(como no poema de Bandeira),
no Cemitério da Igualdade
ou em outro campo santo qualquer.
A própria praça já não existe
na sua sedutora arquitetura de então.
Por causa da usura, dos metais e do tempo,
alguns casarões foram demolidos,
dando lugar a modernosas formas,
sem história, sem lembranças.
Outros permanecem, com os aleijões das “reformas”.
O homem que passava
para sempre ficou
congelado na foto,
em inconclusa passada.
Para onde se foi, com a sua pressa,
com as suas preocupações e planos,
e as suas momentâneas contingências?
Decerto, deserto de tudo,
hoje já não tem pressa,
nem preocupações,
nem dúvidas e dores,
para sempre imoto em sua cova.
A moça bonita, eternamente
moça e bonita na fotografia,
terá morrido moça e bonita
ou terá sentido na pele e na alma
o desmoronar lento do tempo?
A águia metálica
voou do cais do porto
para outro logradouro, de onde,
pousada no poleiro monumental,
assiste o desfilar frenético dos carros,
entre movimentadas avenidas.
Ela, contudo, permanece imóvel,
embora com as longas asas distendidas,
hierática, sem pressa e sem medo.
A maria fumaça que passava
soltando fumaça e apitando
não mais passará, não mais passará,
com as suas negras engrenagens,
nem mesmo travestida
em locomotiva a diesel.
Até os trilhos e dormentes
lhe foram arrancados, e as trilhas, apagadas.
Os namorados que se amavam
e se afagavam, à sombra
da velha pérgola ou do caramanchão
de outrora, ainda se amam, ainda se afagam?
São tantos os sonhos desfeitos...
Um dia, os retratos estarão apagados,
e este poema, esquecido.
E não restará sequer uma tabuleta
ou um bilhete esmaecido
em (esconsa) gaveta.
(*) Após vários anos sem escrever nenhum poema, fiz hoje (22.11.17) este texto, que espero mereça essa classificação ou rótulo.