Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto

[Carlos Evandro Martins Eulálio]

No período de 14 a 21 de junho, estive em Ribeirão Preto,  participando da 15ª Feira Nacional do Livro, edição/2015, com o tema “O Encontro dos Tempos: Novos olhares sobre o passado, o presente e o futuro”. Mário de Andrade, Rubem Alves, Ruth Rocha, Dino Marino e o empresário Chalim Savegnago foram os homenageados.

Ali compareceram Ignácio de Loyola Brandão, Pedro Bandeira, Augusto Cury, Mário Sérgio Cortella, Frei Betto, Ana Miranda, Renato Castanhari, Gregório Duvivier, Guiomar de Grammont, Luiz Felipe Pondé  e outros intelectuais e artistas. Embora com um orçamento 60% menor e reduzido público em relação à edição anterior, o brilho da Feira se manteve. Isso graças à criatividade e o esforço dos que estavam à frente do evento, sempre solícitos e acolhedores para com os visitantes, como o atuante diretor da Fundação Feira do Livro, Edgard de Castro, presente ali em todos os momentos. Centenas de pessoas lotavam os espaços onde aconteciam mesas-redondas, palestras e atrações artísticas. Ressalte-se que a Fundação contou com a parceria do SESC de Ribeirão Preto. Por coincidência, a cidade completava 159 anos de existência, no dia 19 de junho, em meio à realização da Feira. Por essa razão, ela abriu espaço à discussão de problemas ambientais da maior importância para o futuro de Ribeirão Preto. Cito apenas como exemplo o concorrido Salão de Ideias, com a participação do escritor e ambientalista Osmar Barra, com quem mantive contato no momento em que autografava o seu livro “O meio ambiente: da antiguidade aos nossos dias”. Nesse salão, discutiu-se o “Consumo de água no passado, presente e futuro”. 

A Feira foi um belo espetáculo. As palestras aconteciam simultaneamente no Theatro Pedro II, no Centro Cultural Palace (antigo Palace Hotel), na OAB, no SESC, no Colégio Marista e em outros locais apropriados. Convém aqui destacar o Auditório Meira Júnior, localizado dentro do teatro, com capacidade para 200 lugares. Conta com refletores, equipamento de som, varas e mesa de luz, sendo ideal para palestras e eventos corporativos.  O ponto alto da Feira foi a  organização. Para os eventos realizados no Theatro Pedro II, distribuíam-se senhas, gratuitamente, com uma hora de antecedência. Vale dizer que a prioridade dos idosos, crianças e pessoas com deficiência era assegurada. Nos demais locais, a entrada se dava por ordem de chegada. O Theatro Pedro II, com capacidade para mais de mil pessoas, estava sempre lotado.  

Palestras para todos os gostos e todas as idades. Algumas delas são memoráveis, como a da professora e escritora Guiomar de Grammont, que apresentou ao público o romance “Palavras Cruzadas”, narrativa dinâmica, inspirada na aventura suicida dos guerrilheiros do Araguaia, nos tempos sombrios da ditadura militar. Li-o de um fôlego na viagem de volta a Teresina, entre uma conexão e outra nos nossos aeroportos, tal a leveza do estilo da autora cuja técnica de narrar, em capítulos curtos e surpreendentes, seduz o leitor da primeira à última página.

Inácio de Loiola Brandão  ganhou a plateia com seus comentários irônicos e bem humorados sobre os vários temas que aborda em seus livros.  Lançou na Feira sua mais recente obra infanto-juvenil, “Os olhos cegos dos cavalos loucos” que conta um episódio da infância por ele vivenciado com o avô. “Esse livro levei 60 anos para escrevê-lo.” Disse com muita emoção e com lágrimas nos olhos. Esgotou-se na Feira em poucos minutos, na mesma noite da palestra. Do escritor, ficou na lembrança o divertido relato: “Um dia, um professor de matemática me disse, depois de me dar um dez por minha criatividade na resposta totalmente errada de uma equação, ‘o teu mundo é o da imaginação’. E é nesse mundo que vivo até hoje. Talvez, se eu tivesse acertado a resposta daquela equação, eu não teria virado escritor”.

Renato Castanhari, publicitário e escritor, lançou os dois primeiros volumes da obra “Ladeira da Memória”, livros de contos e crônicas, ilustrados pelo artista plástico Zbigniew Campioni.  Antes do lançamento, na palestra que proferiu, Castanhari discorreu de forma bem didática sobre sua experiência como publicitário e ficcionista.

O escritor Pedro Bandeira deu um show à parte com crianças e adolescentes de várias escolas do município. As palestras,  em verdade, constituíam momentos de bate-papos interativos com a plateia interessada pelo tema de preferência. Muitas delas deixaram mensagens significativas como a de Frei Beto, ao declarar que “Estamos vivendo em um país onde, infelizmente, a TV e a internet contêm muita informação, mas a grande maioria é entretenimento vazio e totalmente voltado para o estímulo ao consumismo. Daí a importância da Feira do Livro, porque ela ajuda a pessoa pensar, refletir e enriquecer sua cultura”. Do filósofo Mário Sérgio Cortella, que lançou a obra “Educação convivência e ética”, não esquecemos  as frases: “O amor verdadeiro não aceita tudo”;  “Os filhos estão lendo e os pais estão colorindo para desestressar”;  “5% das pessoas são canalhas e tentam convencer os outros 95% de que não ser canalha é ser otário e que eles são invencíveis. Os canalhas estão perdendo porque nós estamos nos desacovardando. Numa sociedade que tem imprensa livre, plataformas digitais e democracia, o canalha está acuado”. 

Também os autores da terra foram muito prestigiados. No hall de entrada do Centro Cultural Palace, ao lado do Theatro Pedro II, era o local reservado à exposição e venda de livros e peças de arte  dos autores e artistas de Ribeirão Preto. Muito ainda teria de comentar. Deixo o resto para outra ocasião. Para concluir, uma referência sobre a cidade: Ribeirão Preto é  bonita e muito limpa. Nos seus parques e praças, crianças e idosos passeiam tranquilos e com segurança, seja durante o dia ou à noite. Sempre me surpreendia o fato de sair à noite do teatro e me deslocar a pé para o hotel onde estava hospedado, sem receio de assalto. Não houve em Ribeirão registro de ocorrências policiais nesses dias, conforme ressaltou a superintendente da Feira, Viviane de Mendonça. Vale a pena conhecer Ribeirão Preto. No próximo ano, lá estarei novamente..  

(Na foto, o autor deste artigo e o escritor Renato Castanhari, autor de Ladeira da Memória)