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[Bráulio Tavares]

Há muitas maneiras de classificar os gêneros literários, e de acordo com o sistema de classificação, a mesma obra pode pertencer a gêneros diferentes. (É como na Física Quântica – mudou o parâmetro de observação, muda o resultado, ainda que o fenômeno seja o mesmo.) Vejam Star Wars. É ficção científica, se julgarmos pela presença de espaçonaves, robôs, voos interplanetários. Mas de ciência, mesmo, tem pouquíssima coisa ali. Asimov brincava (afetuosamente) com a série dizendo que ela era a respeito das batalhas de aviões da I Guerra Mundial.

Se começarmos a ler romances à procura de obras que empreguem o método científico (observação, dedução, indução, experimentação, uso do raciocínio lógico) talvez cheguemos à conclusão surpreendente de que o romance policial (o de mistério detetivesco) costuma ser muito mais científico do que a maioria da ficção científica, que se baseia largamente em outras coisas: aventura, imaginação fantástica, plots reciclados da mitologia e das lendas clássicas. Ciência, mesmo? Só na obra de radicais como Greg Bear, Greg Egan ou Gregory Benford (não sei o que têm os Gregs para serem tão cartesianos).

Nos romances de detetives o que vemos é uma aplicação constante, minuciosa e inflexível da lógica científica. Indícios são recolhidos e examinados. Detalhes fora do comum são observados e registrados. Hipóteses são formuladas, e, quando é o caso, testadas. Cada hipótese deve ter uma resposta satisfatória para explicar cada indício recolhido (se a vítima foi estrangulada mas há uma mancha de sangue no teto, tem que haver uma explicação para ela).

Um detetive como Philip Marlowe ou o Comissário Maigret não é um físico nem um químico, mas costuma raciocinar com o mesmo rigor, e até mais, se considerarmos que ele lida com as imprevisíveis emoções e reações humanas, para as quais não existem as regras quase absolutas que vigoram nas Ciências Exatas (que aliás são cada vez menos exatas quanto mais as vemos de perto, como sabe quem as pratica). O detetive examina indícios em torno de um fato anormal e os compara com a normalidade, para tentar entender o que aconteceu. É tão científico quanto um médico avaliando um paciente novo ou um mecânico de oficina abrindo o capô de um carro que acabou de chegar via reboque. O pensamento que põem em prática é o pensamento científico, com todas as suas vantagens e suas limitações. Se procurarmos esse pensamento fora da FC hard, será difícil encontrá-lo, principalmente no cinema. O que existe ali é o bom e velho pensamento mágico revestido de aparato pseudo-tecnológico, pois a maioria daquelas máquinas não funcionaria no mundo real.