[WASHINGTON RAMOS

                                                                  ELE NÃO MORREU

     O soneto continua vivo, apesar de muitos poetas já terem anunciado a morte dessa espécie literária, talvez a mais longeva na história da Literatura. Ele surgiu na Itália com o poeta Giacomo de Lentine em pleno século XIII e, para despeito e ódio de vanguardeiros e seus acólitos, está mais vivo do que nunca. A epopeia clássica e dezenas de espécies poéticas como o epitalâmio desapareceram, mas ele continua sendo praticado.

     O que explica tanta longevidade para essa espécie? Afinal, já são 700 anos de existência. Talvez a explicação esteja em sua extraordinária capacidade de síntese, sua estrutura, seu ritmo, suas rimas, seu belo visual ortodoxo de dois quartetos e dois tercetos, ou suas estrofes de 12 e dois versos, ou uma estrofe só, seus versos de qualquer medida, ou ainda seu aspecto de desafio a muitos candidatos a poeta como se dissesse a eles: engendra-me ou não serás um poeta.

     Grandes gênios do passado praticaram o soneto como Petrarca, Camões, Bocage, Shakespeare e muitos outros. Com o Romantismo e seu caráter revolucionário em oposição ao Classicismo, ele foi menos usado. Com o Parnasianismo e o Simbolismo, voltou com carga total. O poeta piauiense Félix Pacheco chegou a compor Em louvor do soneto, poema dedicado à Academia Piauiense de Letras e que, por seu título, já diz muita coisa. Na primeira fase do Modernismo, nova detonação contra ele foi efetivada, mas não o matou. Veio a segunda fase modernista, e poetas como Vinicius de Moraes, Jorge de Lima, Drummond, Dante Milano e Mário Quintana o utilizaram largamente em seus livros. Manuel Bandeira, que pertence a todas as fases do Modernismo, também o cultivou. Soneto da Fidelidade, de Vinicius, é um dos poemas mais conhecidos e recitados no Brasil. Desse modo, fica evidente que a maioria dos grandes poetas brasileiros do século XX usaram essa espécie literária. Na Literatura Piauiense, autores importantes e recentes como H. Dobal e Torquato Neto também cultivaram o velho soneto. Mais recentemente, nosso amigo João Carvalho tem publicado, no CLAn, lindos sonetos de Rogério Freitas, jovem poeta de Oeiras. Em Parnaíba, Carvalho Filho, um vate de apenas 37 anos, publicou Onde estão meus girassóis, bom livro de poesia onde estão vários sonetos.

     Eu mesmo não sou poeta, mas gosto muito de ler poesia, e o soneto é uma das espécies poéticas que mais aprecio.

     É claro que, para ser um bom poeta, a pessoa não é obrigada a fazer um soneto. Há vários poetas que jamais fizeram um soneto e têm seu valor estético. Agora, acredito que, como exercício com as palavras, é bom que um poeta faça um soneto, ou pelo menos experimente fazer um. É bom também que esqueça o preconceito que se criou em torno do soneto na Semana de Arte Moderna. Afinal, já faz mais de cem anos que esse evento passou. Foi importante como ato anárquico para atualizar a poesia brasileira. Mas agora a história é outra, e nela não cabe mais o desprezo ao soneto.