SESSÃO NOSTALGIA:

NOTA  AO LEITOR

O ARTIGO ABAIXO FARÁ  PARTE DO MEU  LIVRO 

                                                                                                            PARA A MEMÓRIA DE MEU  PAI, CUNHA E SILVA (1905-1990)

POLIEDRO DE INSÂNIAS

 

Dois grandes  problemas brasileiros inadiáveis

                                                             

Cunha e Silva Filho

                    

           A mídia brasileira, em todas  as suas formas, não nos deixa mentir: o Brasil se depara com  duas grandes  e intrincadas questões que   se põem à discussão  pela sociedade, pelas autoridades em geral e  pelos  três poderes, não podendo  deixar de incluir, porque são  instâncias  decisivas a uma dessas questões,  os órgãos de segurança  pública e as Forças Armadas. As duas  questões  em foco são a violência  e a saúde pública.

           Aos observadores atentos  à realidade do país, arrisco-me a afirmar que  já atingiu o limite  máximo  de   descalabro algumas áreas   dos governos  Federal,  estaduais e municipais (com as magras exceções  localizadas aqui e ali  no território nacional) cujos  governantes, terminando os seus mandatos ou  iniciando novos  mandatos,   deixam os primeiros   aos sucessores  uma terra arrasada, com um sistema  publico  de saúde  em petição de  miséria,   a  ele faltando  praticamente  tudo: médicos, enfermeiros, auxiliares,  equipe burocrática,   equipamentos,  instalações  adequadas,  emergências que deem conta   da demanda e tudo o mais  que  se pode  designar  corretamente como   uma infraestrtutura  decente e humana, digna  do cidadão  brasileiro que  paga  altíssimos  impostos  e, como retorno,  praticamente  nada recebe  por parte  das autoridades.

           É fácil  perceber que a causa  mais gritante  desse sucateamento   tem sua origem  na corrupção administrativa,  nos desvios  de verbas, na malversação  do  dinheiro   público  e no crime do peculato.. O que se torna juridicamente  insustentável,   ante os fatos   registrados pelos meios de comunicação,  é a completa  ausência   de punição a esses  atos  criminosos  da  administração  pública. Governantes que deixam sua administração em estado de falência devem ser  punidos com  rigor da Lei, não merecendo  mais  se candidatar  a qualquer mandato  público.

            Saem os  ocupantes  de cargos e  seus sucessores constatam  as desídias  e as falcatruas e o resultado  é que  não se tem  visto  nenhum dos  responsáveis  julgados  pela  Justiça. As Câmaras dos Vereadores e as Assembleias   Legislativas,   assim como  a Câmara dos Deputados e o Senado Federal  não têm cumprido  com as suas funções  correspondentes, nem tampouco  se tem visto   se pronunciar  sobre  tais desmandos  e  desvios de dinheiro pelos órgãos  fiscalizadores,  os Tribunais de Conta  em todas  as  hierarquias. Tudo nos dá a impressão  de que  os que exerceram  cargos  executivos   são  as mais perfeitas   pessoas  do mundo!

            Ora,  esse silêncio  me soa   com ares  de  cumplicidade ou  de irresponsabilidade. Não é  possível que  todos  estejam mancomunados  para um julgamento  único  de  opiniões  sobre  ações  administrativas envolvendo  gastos   públicos. Não se ouve uma voz dissonante  que venha  mostrar  à população e à sociedade  mesmo que existam  falhas inaceitáveis, que os culpados devem ser   punidos  administrativa e  criminalmente  pelo mau uso  do dinheiro  do  povo. O país,  assim,  se  coloca  na contramão  de  países   sérios do mundo,  onde  os excessos   de  corrupção   já foram  substancialmente   reduzidos. Em nosso país, me   parece que  não saímos  de  velhas  práticas   administrativas  em que  os governantes  mandavam e desmandavam   sem  receio  de serem  punidos  pelos  seus atos  de vilania   administrativa.

           Neste  ponto, o  país não se modernizou nem  tem sequer  dado sinal  de que  quer  se moralizar diante  das vistas  do  mundo  civilizado. Vários escândalos de  corrupção  implicando  membros e dirigentes,  nos dois mandatos do governo Lula e até do atual governo  federal e a iniciativa  privada, já foram amplamente divulgados pela imprensa. Os brasileiros  aguardamos com ansiedade que o STF  cumpra  com o seus deveres  constitucionais,  determinando que as pessoas  acusadas,  julgadas e sentenciadas,  após  todos os recursos interpostos,  tenham um  destino  certo: a prisão sem brechas nem  subterfúgios engendrados   pela cultura jurídica   brasileira.

          O primeiro  passo   efetivo  para a  redução  dessa má política deveria ser dado através   de uma severa e contínua   fiscalização  do Ministério  Público  e da  Polícia Federal, mas de uma   polícia que  fosse independente,  composta  de  membros  competentes, de cidadãos  que  querem  o  bem-estar  da  nação e não se deixar  levar  por  outros interesses de ambições pessoais  ou de conivência  com   algum  setor   do governo  federal.  O que aflige  o  país  é uma espécie de falta de caráter,  de brasilidade,  de respeito  aos compatriotas a fim de que a máquina burocrática  do Estado   funcione  melhor  e atinja um   patamar de excelência.

          O nosso sistema  de saúde  pública é dos mais catastróficos do mundo, pelo menos  quando  incluímos  o Brasil entre  as nações que  desejam  ingressar na modernidade   do progresso em todos os níveis e servindo a  todas  as classes sociais. Não é o que  acontece  dentro de nossas  fronteiras. Basta  dizer que o interior  do país, no Nordeste,  no Centro-Oeste,  enfim, no país inteiro,  ainda  se registra  um sistema  de saúde  pública   precário e arcaico. O  pais continua sendo  o campeão de contrastes nos níveis de qualidade   de tratamento. Na realidade,  há duas medicinas no  país,  a dos ricos, privada, que é  atendida  pelos  médicos  famosos e com  tecnologia   de ponta,  e  a pública, estadual ou  municipal,  que é a dos  despossuídos, dos pobres, sendo a mais abandonada pelos governos. Tem ainda  a pública federal, que  não dá conta da demanda, e  por último, temos uma quarta também    privada, com  planos   de qualidade  duvidosa.

          Os dois  últimos governos  do PT e o atual   se definem como de esquerda, ou seja, de  uma facção política, que,   repetindo  uma frase de um   experiente   apresentador  de  noticiário  nacional,  composta  de  gente  que “não rasga  o dinheiro.”   As elites econômicas do pais – cumpre  reafirmar - ,   têm a melhor  medicina  aqui dentro de nosso  solo. Não só elas,  as elites  políticas,  os altos burocratas, a cúpula do governo, que, como sabemos,   quando adoecem, não vão para o SUS ou para os hospitais  federais, estaduais ou municipais. Eles só morrem  porque da morte  nem os ricos  escapam, e vão para o  outro lado  resmungando que o seu dinheiro  de miliardário   não foi suficiente  para  impedi-los  da  passagem para  a  mortalidade.

           A outra questão inadiável,  é a violência,  na qual  estão imbricados  vários componentes  de natureza  diversa: droga,   tráfico,  usuário de droga,  prostituição,   corrupção  de parte  da polícia.,  inépcia  de   órgãos de segurança   pública,  pobreza,    patologias sociais,   desestruturação familiar,   preconceitos  raciais, homofobia,  baixo nível  de escolaridade  e  qualidade ainda  precária do ensino  público  estadual e,em parte,   privado.

          O Brasil  vive hoje, se não a mais aguda fase de  escalada de  violência  de sua História, uma das mais  graves  dos últimos  dez ou quinze anos. Com a migração  de  contingente  enorme de sua população vinda dos Norte, Nordeste,  inflando  gigantescamente  as duas capitais   principais do país,  o Rio de Janeiro e São Paulo, e com  o consequente  aumento da favelização  nesses dois  estados da federação,   é óbvio que  os  problemas  cresceram  em  progressão   geométrica, com  isso   redundando  em aumento   de demanda  de  maior número  de emprego, de moradia,  de alimentação, do sistema de saúde, de sistema  de escola, estes, por si sós,   já deficitários,  e o que é pior,  de  subida demográfica, intensificando mais e mais  as  condições  dos pobres e miseráveis. Tal crescimento  populacional,  com todas as suas sequelas,   provocou  maior   avanço  da violência, criminalidade  e crescimento  da marginalidade e  do tráfico de drogas jamais vistos no país.

            A expansão das favelas foi  tão grande tanto no Rio quanto em São Paulo  que difícil  se tornou   equacionar   planos   que  reduzissem  as inevitáveis   sequelas  desse  formigueiro humano  descontrolado. Os males estão aí a olhos vistos,  com    uma  crônica   condição  de  alta violência  e brutalidade  dos crimes   praticados por marginais  que não respeitam mais  autoridades  policiais,  constituindo  uma a espécie de  “estado  paralelo,”  o qual,  a bem da verdade, sofreu  baixas significativas com  a  implementação   emergencial   das chamadas UPPs. Bairros havia no Rio de Janeiro,  por exemplo, que  se tornaram  quase  inabitáveis   para uma moradia digna, tantos eram  os constantes  tiroteios  entre quadrilhas  rivais. Isso melhorou  muito, o que foi  uma   conquista da segurança  pública carioca. Mas, ainda é muito  pouco diante  das atrocidades de crimes que têm  sido  cometidos contra o cidadão comum. 

             Entretanto,  os males  da violência  persistem  insidiosamente  sob  outras  formas,  como  as chamadas  milícias,  grupo de  matadores  que cobram   dinheiro   dos moradores  de comunidades   pobres a fim  de   ali  poderem  morar  com  todas as suas limitações. Essa espécie de “polícia  bandida,” incrustadas  nessas comunidades,  auferem  lucros advindos  de instalações  fraudulentas  de luz,  vendas de gás ou outras formas  de pedágios  para  fins de “convivência  pacífica.”

             O combate  incessante contra criminosos está  adstrito a uma política de segurança  nacional, que não só depende  dos governos  estaduais, mas principalmente  do governo  federal. Cabe   sobretudo ao governo  federal, em todas  as suas  instâncias, seja,  de Justiça,  seja  da política, seja do executivo, a tarefa  espinhosa    de  reduzir  a criminalidade  do país. São necessárias  mudanças  radicais da imagem   que os políticos devem dar ao  povo brasileiro, quer dizer,  a moralização   de nossa  política é fator  preponderante  a dar  exemplo  de cima para  baixo  às camadas  de criminosos atuantes no  país.

             Cumpre  que  políticos ou  governantes, ou qualquer  outro  membro dos três poderes  deem  bons exemplos  de ética e de  vigor  no desempenho de suas altas  funções. Se o cidadão  brasileiro vê bons  exemplos  das autoridades no cumprimento  das suas funções, a sociedade tenderá  a acompanhar e a respeitar  autoridades.

            Por isso,  uma reforma  atualizada  do Código  Penal,  eliminando  os inúmeros benefícios   propiciados  a  criminosos  de alta periculosidade e a  autores  de crimes  hediondos de qualquer  natureza, seguramente há de  inibir   atos  maléficos   à sociedade.

           Dando melhor   educação aos brasileiros,  orientando-os  a serem  cidadãos  éticos e solidários desde  a infância  até a sua formação de adulto, o  Brasil  melhorará  inquestionavelmente   o seu  nível  ético,   de cidadania,  de respeito aos direitos humanos,  de  admiração  por um estado democrático sólido   que,  por suas  mudanças  estruturais,  naturalmente há de se impor  como uma nação   digna  de ser imitada  pelo mundo afora.Essa, sim,  seria a imagem  real e transparente  de nosso  país   e aquela que  ansiamos  por  alcançar . Depende só dos homens de bem e de uma sociedade unida.