DELSON CASTELO BRANCO ROCHA: UM HOMEM QUE SE FEZ HISTÓRIA.

     (*) Franci Monte

      Meu amigo Delson, há muito que eu esperava um momento que pudesse dirigir
algumas palavras a quem aprendi admirar desde meus tempos de criança quando
em Barras chegou nos idos de 1962. Tinha eu 8 anos de idade, ainda com
cheiro de mato, recém chegado do povoado São José, mais conhecido como Lagoa
Seca da Sinhara Monte. Meus pais, Manoel e Zuzu Monte, meus irmãos e minhas
irmãs logo se tornaram possuidores da sua estima e passaram a fazer parte
de seu tão seleto circulo de amizade. Jovem médico começou no Hospital Leônidas
Melo seus primeiros passos na carreira profissional, contando com a orientação
do competente, atencioso, humanitário e, acima de tudo, amigo Dr. José Lages,
homem de conduta ilibada, reserva moral da nossa sociedade, a quem afetivamente
e com muito orgulho eu chamava de Tio Zé Lages, e na companhia de outros
recém-formados que ainda hoje os barrenses guardam na memória e que se tornaram,
tal qual ele, expoentes da medicina no Piauí e no Brasil.
      Cresci ouvindo elogios ao Dr. Delson em todos os segmentos e de todas
as gerações da sociedade barrense e, mais tarde, Teresinense, quando em novembro
de 1968 nossa família se mudou para a capital do Piauí. Em todas as atividades
sócio-culturais e, principalmente, esportivas, lá estava o filho de Lázaro
e Baiinha participando e, muitas das vezes, patrocinando eventos de toda
natureza. Em Barras, enquanto fixou residência, foi assíduo em tudo que era
brincadeira, mais precisamente em festas, verdade que pode ser confirmada
por seus amigos de então e, peço permissão e escusas à Dona Sheila, era muito
assediado pelos brotos do lugar que, segundo seus companheiros de jornada
boêmia, tinha com fartura. O Grande Baile com a Orquestra Românticos Del
Caribe foi um desses inesquecíveis momentos vividos na Terra dos Governadores.
Isso sem falar nos banhos dos rios em que se atirava nos braços do Marataoã
e do Longá, fazendo dos seus leitos seu colo, das suas águas seu divã. Delson
teve e tem por Barras um sentimento imensurável e fácil de ser notado pelo
carinho com que trata seu povo e fala da terra em que nasceu. Para quem não
sabe, quando do seu nascimento, o Peixe, hoje Nossa Senhora dos Remédios,
pertencia à Data de Barras. Portanto, ao receber o Título de Cidadão Barrense,
em verdade foi uma redundância, ou mesmo uma feliz confirmação do que o destino,
com carimbo da história, já tinha lhe reservado: ser filho de Barras do Marataoã.
      Como diz Joaquim Monte, não há poeta, não há cantor, não há homem, por menos
sensível que seja, que não se tenha deixado levar, na saudade, pelas lembranças
de sua terra natal, berço de seus primeiros passos. É, às vezes, com lágrimas
nos olhos que nos desejamos no passado, sentindo a saudade na garganta que
se comprime, nos olhos que marejam, na mente que busca na memória os dias
felizes vividos, palmo a palmo, no seu chão querido ao lado de sua gente?.
Com Delson não foi e nem é diferente. Ainda hoje carrega consigo sentimentos
que o tornam eterno amante da terra em que nasceu, de onde nunca conseguiu
se afastar pelos laços de família e de amizade que mantém cada vez mais fortes.

      Embora sendo torcedor do Piauí Esporte Clube, o grande Enxuga Rato de Sima
e companhia, acompanhei de perto seu trabalho à frente do River Atlético
Clube, ora como torcedor, ora como dirigente. Um apaixonado pelas cores:
vermelho, preto e branco. Um tricolor abnegado. Perdendo ou ganhando levantava
sua bandeira em favor da equipe que escolheu para torcer e amar.
Eu ainda engatinhando no mundo da composição musical fui levado até a rádio
Difusora pelo grande Radialista, Disc jóquei, Noticiarista Barrense Francisco
Medeiros, na época titular do Programa ?Medeiros Com Os Primeiros?, filho
do finado Zé Bia, também locutor e dono de uma voz invejável, para me integrar
ao elenco do Programa ?Um Prego Na Chuteira?, criação e apresentação de Deusdeth
Nunes, a quem a plebe rude e ignara chama de Garrincha, com a responsabilidade
de cantar as paródias por ele compostas. Medeiros já era veterano no Programa.
Comigo também foi a Mirinha, minha irmã. Deu certo. Com o tempo terminei
por aprender a fazer paródias, ao ponto do Garrincha deixar sob minha responsabilidade
essa tarefa. Várias figuras carimbadas do nosso futebol foram vítimas das
nossas sátiras e como não podia deixar de ser, pelo muito que representava
e ainda representa no mundo futebolístico, também fazíamos umas gozações
com o ?Doutorzinho do River?. Delson nos encontrava na rua e dizia: Me deixem
de mão! Para nós era como dizer: façam outra. E de paródia em paródia, o
Prego fazia a alegria dos torcedores que iam ao Albertão e ao Lindolfo Monteiro.
      O Programa ia ao ar sempre uma hora antes de começar o jogo. Quando chegávamos
nos Estádios éramos por uns aplaudidos, por outros, xingados. O Coronel Jofre
não perdoava. Já o Delson, com sua cordialidade costumeira, nos elogiava,
nos abraçava e, estando de longe, levantava os braços, unia as mãos e gesticulava
como se dissesse: valeu! Havia alguns que nos pediam para fazer paródias
com o nome deles. Diziam: Não me deixem de fora. No fundo todos levavam na
brincadeira. Fiz toda a trilha sonora do Programa e na abertura quando cantava:
Um Prego na Chuteira vai entrar...NO AR. Era o vozeirão do Joel Silva anunciando
o começo da gozação.
      O amor que dedica ao River não o impede de torcer pelo sucesso do BARRAS
FUTEBOL CLUBE, o BAFO, que hoje representa com brilhantismo o futebol piauiense
no Campeonato Brasileiro série C. Delson embora com os olhos mais voltados
para Nossa senhora dos Remédios pela terra mãe que representa e pela responsabilidade
política, vigilante e atuante, que por ela tem, nunca deixou de se preocupar,
também, pelos destinos da terra dos intelectuais. Quando deixou Barras para
alçar vôos mais altos na capital piauiense, os versos de Lamartine Babo descrevem
com fidelidade aquele momento de separação: ?parto levando saudades, saudades
deixando?.
      O tempo passou e os encontros foram ficando mais raros, mas nunca nos perdíamos
de vista. Foi então que os acadêmicos acharam por bem me aceitar entre eles.
Barras fazia seu Centenário e eu nascia para a Academia de Letras do vale
do Longá. Muitos amigos encontrei e outros tantos fiz. E, dentre eles, tive
a felicidade de reencontrar no rol dos imortais, aquele cidadão, médico,
que ao longo do tempo, à minha maneira, aprendi a admirar e respeitar, de
tantos atributos e, acima de tudo, amigo de minha família. A admiração aumentou
mais ainda quando descobri naquele, agora confrade, a quem o pai apelidava
de facão, afilhado do Desembargador Arimathéa Tito, um exímio orador. Não
o aplaudi como devia, quando pela primeira pude me deleitar com sua oratória.
Confesso que não conhecia mais essa sua proeza. Fiquei abismado, admirado
e ao menos tempo me cobrando por que eu ainda não sabia de sua capacidade
de improvisar, de juntar palavras com tanta facilidade e com tão profundo
conhecimento. Linguagem poética recheada de conhecimentos gerais. Sentimentos
saindo pelos poros da imaginação, verdades brotando das mais profundas raízes
do ser. De reunião em reunião, percebi que ele era o nosso coringa do saber,
quando por um motivo qualquer se precisava fazer de última hora uma saudação
a alguém, logo a solução era anunciada: o ?Delson tai!? Era unanimidade.
E ele na sua infinita bondade, humildemente concordava. Também, quem mandara
ser inteligente! Em mim surgia mais uma referência, digna de aplausos, do
talento do menino que veio do Peixe, chegou rapaz em Teresina, foi universitário
em Recife, passou médico por Barras e fincou raiz profissional e familiar
na cidade verde, cujo povo e terra aprendera a amar e defender e que por
justa razão recebe o Título de Cidadão Teresinense ainda este mês, um reconhecimento
para quem, em verdade, já é cidadão de Teresina desde que nesse chão do Conselheiro
saraiva se abrigou e tem todo um trabalho realizado em favor da coletividade,
missão que continua a executar com dedicação, competência e presteza. Ao
lado de sua esposa, Sheila, e seus filhos Delson , Samantha, Daise, Sheila
e Bernardino Lázaro e demais familiares e amigos estará, com emoção à flor
da pele, se tornando o mais novo filho da terra Mafrense e não se espantem
se por baixo do terno estiver vestido com a camisa do River.
      Fiquei, inicialmente, com receio de aceitar tamanha responsabilidade de fazer
essa saudação a quem é um mestre nesse ofício. Mas quando fui convidá-lo,
juntamente com os filhos, Monte e Antenor, para reverenciar Barras pelo seu
aniversário, foi sugerido que ele falasse com o coração, sem a preocupação
de se aprofundar na história de Barras. Nós queríamos era que ele desse seu
depoimento de quando morou em Barras. Saber de coisas que ele presenciou
com seus olhos de rapaz. Do que viu e protagonizou no chão de David Caldas.
Dar seu testemunho de como era a cidade nos anos 60. Aí, como ele recebeu
bem a idéia, não me fiz de rogado, sabendo que teria, também, pela frente
uma grande responsabilidade, adotei imediatamente a sugestão e deixei falar
a voz da amizade.
      Tahyane Rangel nos fala de pessoas que entram em nossa vida, passam a fazer
parte dela.. Na convivência do dia a dia, deixam suas marcas em pequenos
atos: em um sorriso, uma ajuda, em palavras e sentimentos que se repetem
e que passam a ser a sua marca pessoal, aquela marca que fica personalizada
em nossos corações...amigos que chegam e que ficam, amigos que passam, amigos
que retornam...novos e velhos amigos e os eternos...amigos eternos estão
sempre em nossos corações. Para estes não existem barreiras, não existe distância,
não existe tempo, o tempo é sempre o presente e o presente é vivo!...nunca
morrerá, por isto é eterno! Você é um amigo eterno, e está aqui agora, presente
neste momento, vivo como nunca antes foi e sempre estará vivo e presente
em nós!? Pela natividade não somos da mesma geração, mas pelo sentimento,
pelos conhecimentos adquiridos, pelas idéias que defendemos, pelo hoje que
vivemos, pelo futuro que projetamos, pela capacidade de amar e de perdoar,
de fazer amigos e de conservá-los, pelo respeito que temos a Deus e à família,
pela coragem que temos de "viver e não ter a vergonha de ser feliz", há
muito que nossas gerações caminham juntas. Talvez não fôssemos tão pertos
um do outro se tivéssemos a mesma idade física. A fonte da juventude está
em viver o que se quer e ter vivido o que se quis.
      Para finalizar faço minhas as palavras de minha colega de Academia e sua
querida irmã Daise, quando se refere ao nosso homenageado, conterrâneo e
amigo, como ?pequeno na estatura, grande na opinião dos que o conhecem, homem
de sociedade, cidadão de inabaláveis princípios cívicos e religiosos, forte
como uma rocha, bravo como os heróis, persistente nas lutas, sereno nas tempestades,
justo e sábio no Senhor, incansável na prática do bem e da verdade. Gosta
das coisas simples como pescar, deglutir um bom vinho, tomar uma "geladinha",
participar das rodas de amigos e compadres, abençoar os incontáveis afilhados.
Sou grato pelo espaço que me foi concedido para falar de tão querida pessoa
e de tamanha nobreza de espírito. Meu pai, Manoel Monte, que também foi seu
amigo e admirador, com certeza está endossando todas as minhas palavras.
Não sei se correspondi à expectativa dos meus companheiros de academia, sei,
porém, e digo com toda certeza, que na próxima saudação que tiver votarei,
incontinenti, nos nomes daqueles que concordaram com a minha fala e me botaram
nessa fogueira, nessa boca quente. Delson, Deus te abençoe e te dê muitos
anos de vida. Seja feliz ainda mais. E não esqueça: felicidade, idade feliz,
tem-se o tempo a viver, o vivido não se tem. Obrigado por você ser meu amigo.
Que Jesus Cristo e Nossa Senhora da Conceição protejam a nós todos.

 Franci Monte é compositor, poeta e membro da Alval