Facsimile de jornal anunciando a fundação da Academia de Letras
Facsimile de jornal anunciando a fundação da Academia de Letras

Reginaldo Miranda[1]

Advogado, político, jornalista, orador, poeta e contista piauiense, nascido em 1872, na cidade de Teresina, filho do médico e político Simplício de Souza Mendes e de sua segunda esposa Luiza Francisca de Assis.

Iniciou os estudos na cidade natal, matriculando-se no Liceu Piauiense, onde cursou os preparatórios, concluindo-os em 1893. Nessa época, ou melhor, desde o ano de 1888, concomitantemente com os estudos secundários, lecionou geometria[2] e militou na imprensa piauiense como redator e editor do jornal O Piauhy, que assim reconhece o talento do então estudante teresinense no Recife

“Talento brilhante, aliado a um caráter sem jaça, Archelau Mendes tem honrado sobremodo o nome piauhyense, distinguindo-se na faculdade de direito do Recife, onde é justamente considerado o primeiro estudante do seu ano. Durante cerca de um lustro Archelau, pode-se dizer que foi a encarnação viva do nosso jornal, tanto no noticiário como no editorial, onde escreveu artigos brilhantes, muitos dos quais eram reputados como verdadeiras obras primas de literatura e de crítica científica.

‘Os nossos amigos das localidades encontraram sempre na pessoa de Archelau um defensor acérrimo dos seus direitos e raros são talvez aqueles que tenham ciência que à pena de Archelau devem mais de um triunfo adquirido na política. O ‘Piauhy’ cumpre um sagrado dever felicitando o moço ilustre que tanto tem honrado o nome piauhyense na heroica terra de Pedro Ivo e Nunes Machado”[3].

Em 1894, ingressou na Faculdade de Direito do Recife distinguindo-se entre os colegas pela inteligência invulgar e aplicação nos estudos. Ainda terceiranista assumiu o cargo de amanuense da Escola de Engenharia de Pernambuco, nomeado por decreto de 3 de março de 1896[4].

Concluiu os estudos jurídicos em 6 de dezembro de 1896, retornando à terra natal[5] onde continuou sua militância na imprensa como “principal redator” do jornal O Piauhy, onde “deixou várias poesias esparsas, artigos de polêmica, doutrinários, de política local e geral, de crítica religiosa e literária, contos, etc.[6]”. 

Também, abriu banca de advocacia, destacando-se pela palavra fácil, tanto falada na tribuna forense quanto escrita nas peças processuais. Fez nome no foro, mais tarde, assumindo a Procuradoria-Geral do Estado. Concomitantemente, assumiu as cátedras de história universal, sociologia e noções de economia política e direito pátrio no Liceu Piauiense. Na mesma instituição de ensino foi professor substituto de português.

Orador brilhante, desde a mocidade fez-se presente nas grandes manifestações cívicas, patrióticas, culturais e populares de Teresina, empolgando a plateia pela palavra fácil, fluente. Era quase o orador oficial da cidade nos principais eventos que se realizaram por uma década, entre 1893 a 1904[7].

Segundo registros, em 1898, continuava sendo “ilustrado redator do ‘Piauhy’”[8]. No ano seguinte, tratado por “ilustre” e “distinto advogado residente em Theresina, onde exerce importantes cargos de confiança”[9]. Em 9 de julho de 1899, integrou a comissão de imprensa na recepção ao festejado escritor Coelho Neto, em visita à cidade de Teresina, sendo um dos que o brindaram[10].

Foi nomeado juiz do Tribunal de Contas do Estado do Piauí, criado pela Lei n.º 210, de 1º de julho de 1899 e regulado pelo Decreto n.º 139, de 25 do mesmo mês e ano, sendo instalado oficialmente em 1º de agosto[11].

Por aquele tempo não havia manifestação cultural na cidade de Teresina, que não contasse com a participação do jovem advogado Archelau de Souza Mendes. Em 4 de agosto de 1901, participou da fundação da “Academia de Lettras Piauhyenses”, ao lado de outros “distinctos e ilustres piauhyenses”, a saber: drs. Clodoaldo Freitas, Hygino Cunha, Antonino Freire, Domingos Monteiro, João Pinheiro, Luiz Evandro, major Manoel Lopes Correia Lima e Phoncion Caldas, “com o fim de examinar e emittir parecer sobre theorias, problemas e questões da actualidade; acompanhar o movimento intellectual; scientífico e culto; estabelecer palestras e conferências; trabalhar pelo levantamento da instrucção; publicar obras de seus sócios e tudo fazer pelo desenvolvimento e divulgação das lettras piauhyenses”. Hygino Cunha, Clodoaldo Freitas e João Pinheiro ficaram encarregados de elaborar os estatutos. O jornal Nortista, assim saudou essa iniciativa:

“É possuído do mais justo contentamento que, nos congratulando com os nossos talentosos patrícios que tiveram a grandiosa ideia da fundação de tão importante associação, que, incontestavelmente trará muitos benefícios para o nosso querido Estado tornando conhecidos os nossos homens de letras e bem assim os factos passados entre nós; e concitando aos promotores de tão alevantado cometimento, a não terem um só momento de desânimo nem de desfalecimento e que com toda a abnegação e força de vontade levem a efeito o seu projecto, desejamos à Academia de Lettras Piauhyenses, um futuro próspero e longo”[12].

Contudo, essa fundação não teve seguimento, fenecendo sem frutos essa importante iniciativa cultural. Em 1917, quando alguns desses fundadores que ainda se encontravam em atividade na cidade de Teresina, retomaram a ideia de fundação de uma Academia de Letras, por vaidade ou questões políticas, o fizeram sem dar sequência a esta, agindo como se fora uma nova fundação. Todavia, não podemos deixar que caia no olvido o nome e o gesto grandioso desses pioneiros das letras piauienses.

Militando no partido republicano federal, o dr. Archelau Mendes foi eleito no pleito de 1900, para o conselho municipal de Teresina, hoje vereador. Novamente, candidato à reeleição no pleito que se travaria em 16 de novembro de 1904, faleceu dois dias antes, figurando na chapa eleita[13].

De saúde frágil, em outubro de 1904, “por motivo de moléstia”, foi “para Caxias, afim de passar algum tempo no aprazível lugar ‘Fonte’”, onde demorou-se pouco tempo[14]. Agravando-se o seu estado de saúde, retornou à cidade de Teresina, onde era candidato ao parlamento municipal, vindo a óbito em 14 de novembro daquele ano, com apenas 32 anos de idade. O Diário do Maranhão, assim anunciou o óbito do esperançoso e aguerrido advogado e jornalista:

“Na Therezina, onde, além de advogado, ocupava o cargo de Procurador geral do Estado e fazia parte da redação do ‘Piauhy’, faleceu, no dia 14, o Dr. Archelau de Souza Mendes, ainda muito moço.

‘Era parente do ilustre Dr. Álvaro d’Assis Osório Mendes[15], Governador do Estado do Piauhy, e concunhado do sr. alferes Azarias José de Souza, do 35° batalhão.

‘A estes e demais parentes do finado, e seus companheiros nas lutas da imprensa e amigos, d’aqui enviamos as nossas sinceras homenagens à memória do estimado morto, e pêsames para quem era ele bom parente amigo”[16].  

O dr. Archelau de Souza Mendes faleceu muito jovem, em plena ascensão politica e profissional. Certamente, se não tivesse a vida ceifada tão cedo teria brilhado nas letras, no foro, na administração pública e no parlamento nacional, onde brilharam outros de seus familiares. Não deixou livros publicados, apenas uma obra esparsa que merece ser resgatada para fortalecimento das letras piauienses, imperecimento de sua memória e gaudio dos leitores, entre essas, os contos: Suprema Lição, O Natal e Fatal Intimação.

Foi precavido, deixando seguro de vida para a família, cuja viúva inventariante e cabeça do casal resgatou, por seus procuradores, em  29 de maio de 1905, da “Sociedade de Seguros Mútuos à Vida” denominada “Garantia da Amazônia”, a importância de dez contos de reis (10:000$000), em liquidação da apólice de seguro de vida do falecido[17]. Era casado com d. Maria Thereza de Miranda Mendes (Cotinha Mendes), maranhense, filha do capitão José Félix de Sousa Miranda e de sua esposa Benedita Leopoldina de Miranda. Ao que conseguimos apurar, deixou dois filhos[18]: 1. Christina de Miranda Mendes, nascida em 24 de julho de 1900; casada em 31 de outubro de 1916, na Ilha do Governador, com o catarinense aspirante a Oficial Heitor Cabral de Ulisséa, filho de Ismael Pinto de Ulisséa e Ana Cabral dee Ulisséa; e, 2. Dr. Aluizio de Miranda Mendes, nascido em 1º de novembro de 1901, casado em Paris (França), em data de 1º. de agosto de 1933, com Madalena Clementino Pires.

 

 

 

 

 

 


[1] Membro titular da APL e do IHGPI.

[2] Jornal do Recife,30.8.1891.

[3] O Piauhy, 14.3.1896.

[4] Estado do Piauhy, 31.1.1890. Diário do Maranhão, 11.9.1895. Jornal do Recife, 5.3.1896. Diário de Pernambuco, 7.12.1921.

[5] Fixou residência à Rua S. Theodoro Pacheco, centro da Capital.

[6] PINHEIRO, João. Literatura Piauiense. 3ª Ed.. Coleção Centenário 11. Teresina: APL, 2014.

[7] Jornal do Brasil, 27.6.1893; Gazeta de Notícias, 28.3.1895. Anais da Câmara dos Deputados, sessão de 3.5.1895.

[8] Jornal de Caxias, 3.12.1898.

[9] Jornal de Caxias, 28.1.1899.

[10] Jornal de Caxias, 8.7.1899.

[11] Mensagem apresentada à Câmara Legislativa em 1.6.1900, pelo Gov. Raimundo Arthur de Vasconcelos. Theresina: Typ. do “Piauhy”, 1900.

[12] Nortista, 21.9.1901.

[13] “O Dr. Archelau de Souza Mendes, falecido ultimamente, era candidato apresentado pelo partido republicano governista do Piauhy, ao lugar de conselheiro municipal da capital, na eleição havida em 16 do mez p. passado” (Diário do Maranhão, 1.12.1904).

 

[14] Diário do Maranhão, 14.10.1904.

[15] Meio-irmão, ambos filhos do Dr. Simplício Mendes, sendo irmãs as genitoras.

[16] Diário do Maranhão, 17.11.1904.

[17] Pacotilha, 31.5.1905; Diário do Piauhy, 10.9.1912.

[18] Adelaide de Souza Mendes, faleceu ao nascer em 1899.