A estátua pensa
Por Rogel Samuel Em: 04/07/2008, às 01H49
O pensador de Gabriela Mistral, na tradução de Manuel Bandeira:
Apoiando na mão rugosa o queixo fino,
O Pensador reflete que é carne sem defesa:
Carne da cova, nua em face do destino,
Carne que odeia a morte e tremeu de beleza.
E tremeu de amor toda a primavera ardente,
E hoje, no outono, afoga-se em verdade e tristeza.
O "havemos de morrer" passa-lhe pela mente
Quando no bronze cai a noturna escureza.
E na angústia seus músculos se fendem sofredores.
Sua carne sulcada enche-se de terrores,
Fende-se, como a folha de outono, ao Senhor forte
Que o reclama nos bronzes. Não há árvore torcida
Pelo sol na planície, nem leão de anca ferida,
Crispados como este homem que medita na morte.
“O pensador de Rodin” começa com a mão rugosa que apóia o queixo fino daquele homem-estátua que pensa a morte, daquela estátua pensante que é de carne em bronze, carne-cadáver e morbígena, na morbidez de tudo que pode desaparecer, ou carne cova, infensa, nua sobre seu destino – o Pensador morituro – a filosofia amortalhada, entorpecido no seu cismar da morte que odeia e que ali está eternizada em bronze, ele que tremeu de beleza na juventude e hoje, velho e na verdade e na tristeza pensa destruição e ruína eternizada em arte. E a carne se encrespa e franze, se contrai e se crispa de espasmódico sofrimento, como nenhuma árvore morta o fez ao sol, como nenhum leão moribundo gemeu na contorção planície, da sofrida própria carne cheia de terrores, na aflição introspectiva do pensamento do fim.