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Como já disse o sermonista barroco português-brasileiro Padre Antônio Vieira, as palavras têm mistérios. “Partes sólidas, estreitas”. As indiazinhas Numas rogelianas não possuem as partes exuberantes das vitalizadas e jovens mulheres índias. As índias joviais possuem formas arredondadas, sensuais, femininas. As indiazinhas Numas da ficção pós-modernista, assim como as lendárias amazonas guerreiras da antiguidade greco-romana, são masculinizadas. As indiazinhas do texto ficcional desta atualidade entrópica “desaparecem uma na outra”. Penso que, se o ato fosse realmente lésbico, as indiazinhas Numas não desapareceriam uma na outra, pelo menos, por meio dos órgãos sexuais considerados tradicionalmente como normais. Em se tratando de relacionamento sexual entre duas mulheres, não há como uma se introduzir na outra, no ar. De sorte que, por interferência do alargadíssimo imaginário-em-aberto de quem realmente narra, o vento mítico (associado à água mítica, transformadora) encobre o narrador-personagem Ribamar de Sousa e faz “o morno rio [sexual-imaginário] [ressurgir], como látex do sangue aquecido”, sacralizando o ato sexual-amoroso (diferenciado) das duas divindades númicas.

 

“O morno rio ressurge, como látex do sangue aquecido”. “Rio”, “látex” e “sangue”. Recupero Bachelard. Encontro-me às voltas com a palavra “rio”, colocada comparativamente ao “sangue” e ao “látex”, indistintamente, neste parágrafo sobre o amor transcendental entre as duas indiazinhas Numas. A palavra “rio” associada ao “sangue” e ao “látex” está ali subentendida como um “sangue maldito”, à moda de Poe, ou como “um sangue valoroso”, à semelhança de Paul Claudel? Penso que este “rio” em especial possui as qualidades simbólicas referentes às três dimensões - sócio-substancial, mítico-substancial e ficcional - desta obra literária pós-moderna/pós-modernista de Segunda Geração, ou seja, a palavra “rio” tanto poderá ser avaliada pelo plano subjetivo quanto pelo plano objetivo ou pelo imaginário-em-aberto do narrador principal.