0

No segmento narrativo-ficcional do capítulo CINCO: FERREIRA, (não confundir com narrativa épica), a chamada narrativa de acontecimento (marca das narrativas do século XX), diferente das narrativas de personagem do romantismo e das narrativas de espaço do realismo-naturalismo, se faz visível. Para penetrar no Palácio de Pierre Bataillon, o narrador-personagem Ribamar de Sousa utiliza-se da técnica ficcional do acontecimento fantástico, uma vez que não há nada que explique como Ribamar se salvou, depois do incêndio da Floresta, onde pereceram seus “parentes”, o tio e o irmão. Pelo ponto de vista dos estudos semiológicos do texto ficcional (de segunda geração), tal impasse narrativo é denominado como narrativa de acontecimento, modalidade fantástica, justamente porque não há as tais explicações lineares, e o personagem se recupera no plano das probabilidades existenciais sem se lembrar dos detalhes do acontecimento insólito. Entretanto, ainda de acordo com a semiologia de segunda geração (Greimás, Roland Barthes, Anazildo Vasconcelos), o personagem se restaura de uma forma diferente da anterior, ou seja, o Ribamar não mostrará mais a face do retirante nordestino, assumindo, por outro lado, as feições do político manauara. Recuperando aqui as diretivas foucaultianas: se antes faltou ao estudioso francês o “regime discursivo”, dos efeitos do poder próprios do jogo enunciativo, para teorizar sobre as palavras e as coisas, em seu livro do mesmo nome, preso que estava, à época, às normas do poder estruturalista, atualmente já há como desenvolver um pensamento interpretativo, mesmo que este se volatilize a partir do próprio estruturalismo. Para repensar este capítulo do romance, não há como sistematizá-lo em um só paradigma teórico. A própria escrita telegráfica do primeiro parágrafo assim o impõe. São períodos curtos, são flashes instantâneos, como bem explica o narrador Ribamar de Sousa: “Flashes fracos, aparecem e desaparecem. A imagem de meu irmão morto se projeta e se apaga em minha mente. Mas não dói. É imagem vaga, frouxa”[xxxix]. Nestes aparentes flashes fracos (flashes fortes), o narrador-personagem sintetiza uma cena cinematográfica que poderia preencher páginas e páginas de escrita paraliterária. No entanto, com poucas e criativas palavras, o narrador ficcional pós-moderno/pós-modernista de Segunda Geração conduz os leitores a uma cena ímpar: o aparecimento de Ribamar, depois da interseção ígnea, no cais fluvial de Pierre Bataillon, trazido pelas águas, como Moisés do Egito.